O cerimonialismo farisaico de nossa religiosidade protestante (evangélica) é paradoxal, confuso e em muitos aspectos incoerente. Digo isto por ser evangélico protestante, não sou desigrejado e tenho pavor e desconfiança de quem não consegue relacionar-se em comunidade e passa a atirar as pedras que lhe cabem.
Dediquei grande parte de
minha juventude, ou pelo menos os anos de maior fervor energético, no cuidado
com minha família e ajudando a Igreja em que me “igrejava”. Foi o calor de servir
numa comunidade com erros e acertos, mas, cheia de companheirismo e amizade,
surgida pelo tecer da Palavra que aprendi a pensar o Evangelho não como uma
utopia platônica, um ideal de Igreja a ser alcançado, mas, de viver o pé no
chão do Evangelho, com suor, lágrimas, sangue, sorrisos, abraços e muitas
despedidas.
Tive muita sorte (leia-se
propósito de Deus) de conhecer muita gente boa trilhando o Caminho da Graça com
graça. E pude discorrer sobre filosofia e teologia com as pessoas mais
improváveis neste universo protestante repleto de rótulos pedantes e
academicismos sem fim. Muitos dos “teólogos” que me socorreram não tinham
diplomas na parede para ostentar. Sentavam comigo, às vezes na EBD, e durante a
semana vendiam cachorro quente em carrocinhas; outros eram sacoleiros,
prestamistas e alguns traziam a rudeza da lida expostas nas mãos, mas
transbordava ternura no coração.
Não estou fazendo uma defesa
ao lugar comum, a ignorância simplista temerosa do conhecimento. Isto é um
absurdo! Uma vez que o povo peca por falta de conhecimento, e o intelectual,
por não considerar nem conhecer o poder de Deus.
Precisamos estudar
academicamente, cientificamente, metodologicamente, com tremor e temor a
Palavra de Deus para poder servir ao nosso Deus espalhando esse conhecimento em
nossas comunidades. As nossas instituições, que são dedicadas a tal missão não
podem ceder a tentação de transformar o conhecimento numa arma para a criação
de classes especiais de modernos sacerdotes, as castas do saber.
Estou dizendo estas coisas
porque não fomos capazes de repensar cerimonialismos e tradições sem
significado algum para a fé cristã, mas, que nos são apresentadas como símbolos
identificadores de uma fé.
Hoje pela manhã, enquanto procurava
um calção deparei-me com meu velho paletó (leia-se terno completo). Faz tempo
que ele está lá. Deve está perto de completar dois anos que não o uso. É
bonito, deixa o homem elegante e com pinta de ser alguma coisa, principalmente
quando se está diante de uma comunidade pobre e humilde.
Aborreci-me dessa
indumentária tão típica em nosso meio e tão inútil ao coração da fé. Lembro-me
a primeira vez que cheguei à Igreja com tal indumentária, e o espanto
apreciativo de todos. Recebi muitos elogios e quase acreditei que aquele
composto de tecidos sobrepostos me fizesse ser algo superior. É um grande
perigo que se corre com essas tradições que caduca a fé.
Tenho feito o possível para
não usá-lo. Não como uma birra infantil, mas por não me sentir confortável e
ser totalmente dispensável para nossa vivência real de Cristo em nós. Ainda
mais nesse calorão que faz em nossa terra.
Pago o preço desta minha
escolha. Tudo na vida tem uma conseqüência. Noto em muitos irmãos uma
desconfiança felina além do olhar frustrante de saber que o pregador vai ocupar
o púlpito de mangas curtas. No trajeto que faço a pé até a Igreja aos domingos,
percebo o desprezo de alguns ao encontrar e saudar um presbítero tão
deselegante. Isso porque não citei os que com uma superlativa superioridade do
alto de suas vestes, fitam-me de cima abaixo como se eu fosse uma afronta aos
“padrões” da fé.
Fazer o que?
Dia deste sobrou até para o
Tony (Arte de Chocar). Vieram denunciá-lo a mim, pois ele estava no Culto,
louvando de boné, e isso era um absurdo.
Ah! Teve quem viesse
“entregar” alguns jovens que estavam participando da EBD de bermudão...
Ora, tem coisa mais gostosa
que chinelo de dedo, um velho calção, camisa leve de malha e a liberdade de um
Deus que se aninha em meu peito e me convida a adorar em espírito e em verdade.
Mas o contrário também é
verdadeiro. Há quem aprecie e goste dos trajes por elegância e etiqueta, sem,
no entanto, deixar-se levar pela vaidade ou tradições de usos e costumes. Isso
é legal e faz parte da convivência comunitária, até porque tem ocasiões que
somos que obrigados as sociais.
E o paletó, quando acordei,
continuou lá...
Veio uma de parodiar
Vinícius...
Um velho calção de banho
O dia pra adorar
O Deus que não tem tamanho
Sua graça inteira no ar.
O Cristo viver seguindo
E sentir o alívio no corpo
Sorver do Mestre o ensino
Como uma água de coco.
É bom...
Passar uma tarde em Jacumã
Ao sol que arde em Jacumã
Ouvir o Senhor em Jacumã
Servir a Deus em Jacumã.
Especialmente para o Tony,
Silvano, Jairo e todos os jacumistas de plantão.
N’Ele, em quem andamos,
respiramos e existimos.
P.S: Para o título deste
artigo peguei por empréstimo o miniconto do escritor guatemalteco Augusto
Monterosso, substituindo o dinossauro, é claro
Eita Jofre...é verdade! O que disseste é verdade, lamentável, e desafiador.
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