“Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus”
(Mateus 22.29)
Outro dia ouvi uma palestra
onde um renomado teólogo brasileiro aconselhou seus ouvintes a não lerem a
Bíblia, pois ela enlouquece ou pode levar a loucura os seus leitores. E não era
uma ironia. Partia das experiências de vida desde sua tenra idade e da sua
própria mãe que foram impregnadas em sua existência, e associada a seu caminhar
intelectual lhe fez chegar a tal equação: que a leitura constante e
ininterrupta da Palavra pode comprometer o equilíbrio mental das pessoas.
Estranho e constrangedor
vindo de alguém que deveria nos estimular a leitura das Sagradas Letras como
exercício libertário e uma experiência com o poder de Deus na Palavra. Estranho
e constrangedor perceber que entre nós, ditos cristãos, têm-se desenvolvido uma
religiosidade desamparada do único elemento que fundamenta toda nossa ortodoxia
e disciplina vivencial, a Bíblia. Estranho e constrangedor o quanto é incômodo
nos dias de hoje, nos disciplinarmos no exercício da leitura diária das
Escrituras. Inventamos as desculpas que nos cabem, mas, não cabe no que
verbalizamos ser: cristãos!
Observamos, então, existir
uma blibliofobia em pleno crescimento entre nós, e que a reboque trás graves conseqüências
para Igreja.
Certa vez ouvi de um chefe de
família que lia a Bíblia apenas nos encontros de casal, pois, era quando tinham
tempo.
Outro, disse que não
suportava a leitura por conta das narrativas do tipo genealogias ou Números.
Houve quem alegou que sua
indisponibilidade era o fato de que o Antigo Testamento respingava sangue.
Teve ainda, quem confessou o
medo do Apocalipse e por isso não lia.
Esses foram alguns casos que
testemunhei há pouco tempo. O grande lamento e espanto é que essa negligência
gera uma ignorância crônica pelas questões mais básicas da Palavra e que formam
a base de nossa fé cristã. Há uma mania de crer no que é proposto pelos
pregadores literalmente, sem o menor esforço de buscar a chancelaria do que foi
posto na Palavra. Outra mania é optar tão somente pelo simplismo textual como
se fosse resposta para tudo o não ter resposta. O que não é verdade, pois,
deste modo criamos uma religião não pensante, que não tem o que responder ao
mundo de agora, a não ser o clássico: “é coisa do diabo, arreda!”.
Para completar temos a
cultura das porções, dos versículos isolados e usados como autorizadores de
toda e qualquer bizarrice e cretinice nos campos pelo mundo.
Então, temos a geração das
porções.
É a Bíblia mutilada de seu
contexto e esvaziada em seu real significado. Aviltada de sua honra como
Palavra de Deus, usada e abusada como palavra de homens. Rotulada pelas
empresas “ministério” que nos oferece perigosos atalhos para nos fazer enxergar
a verdade que eles querem construir. Furtada de seu propósito e
instrumentalizada como patuá ou ferramenta de fazer fortunas. Torturada para
diga o que não diz, mas sim, a “verdade” do seu torturador. Silenciada, porque
não mais expõe o plano de Deus, mas, serve como revelação apenas para o
personalismo de cada um, nas porções preferidas, que se contradizem devido o
mau uso e não tem significado global apenas o egoísmo do “eu”.
Um dos resultados dessa
cultura é o algemar do Evangelho.
Então:
“Deus
é amor” (João 4.8) não é
mais uma expressão que traz a significação do amor de Deus em conceder seu
Filho Unigênito para nos resgatar e purificar do pecado, e que esse
entendimento nos deve conduzir a um viver comunitário ditado nesse parâmetro de
amor. A teologia das porções transformou num enunciado que paralisa qualquer
ação divina de condenação de pecado e conduta humana que fere os mais
elementares princípios de sua Palavra. Outro problema desse tipo de teologia é
que mundo o absorve rapidamente e assim se nutre da inverdade e tenta
inviabilizar e desclassificar a Igreja de Cristo e sua conduta.
“Não
julgueis, para que não sejais julgados” (Mateus 7.1) não é mais um princípio norteador para a
comunidade e para o “eu” pessoal não emita sentenças condenatórias a cerca de
pessoas baseadas em nossa lógica ou nosso parâmetro hipócrita. Ou seja,
condenar os outros por aquilo que nós também, de uma forma ou de outra fazemos
(às vezes em secreto), além, disso o texto denuncia a nossa incapacidade de
exercer misericórdia. A teologia das porções manieta os cristãos com a
aplicação simplista do versículo tornando como coisa imprópria a capacidade de
discernir as ações, pensamentos e idéias, furtando do ensino de Cristo esse
elemento, exposto em Mateus 7.15-16; Lucas 6.43-45.
“E
tudo que pedires em meu Nome, isso farei, a fim de que o Pai seja glorificado
no Filho” (João 14.13)
não é mais uma expressão dentro do ensino de oração, pela qual quem ora é
identificado com Jesus e os seus propósitos. A teologia das porções transformou
esse versículo e seus paralelos numa ferramenta de coação contra Deus, no qual
Ele, o Senhor é obrigado a atender os pedidos dos “adoradores” pelo simples fato de o fazerem usando a
codificação etimológica do nome “Jesus”. Como ouvi certa vez de um pregador,
que Deus era obrigado a assim proceder por causa dos que orassem dessa forma.
Esses são apenas alguns
exemplos para não ficar deveras extenso o artigo.
Contra tudo isso, exponho
algumas exortações:
Leiamos a Bíblia sempre, e todo
dia. Procurar ler ela toda, sem a preocupação se durará um anos ou mais, não
fique paranóico com os planos de leituras, use-os como orientação e ajuda para
tuas leituras, mas, se não conseguir segui-lo, siga lendo as Escrituras sempre,
e todo o dia.
Leia a Bíblia como uma
experiência de encontro com o Deus da Palavra. Evite os óculos denominacionais,
tente vencer a tentação das Bíblias rotuladas (aquelas que são da “vitória
financeira”, “de fulano de tal” “disso ou daquilo”), leia sem a impregnação
teológica que procura nos influenciar, mas, como um adorador em busca do Deus
que motiva sua adoração.
Leia a Bíblia com temor,
reverência e amor, buscando nela os elementos que solidificam a nossa caminhada
cristã, mesmo que nosso caminho seja pelo mar revolto.
Leia a Bíblia não como um
livro mágico, mas, como a Palavra Revelação Especial de Deus, inspirada pelo
Espírito de Deus e pela qual nos tornamos sábios para a salvação.
Leia a Bíblia com sua
família.
Leia a Bíblia por que ama a
Deus, e quem ama Deus ama a sua Palavra e não sabemos se amamos a Deus se lemos
a sua Palavra.
A leitura da Bíblia não
enlouquece ninguém. Essa é uma das mais absurdas mentiras que já ouvi. Nunca vi
ninguém dizer que alguém ficou maluco por ter lido ou visto muita revista
pornográfica, ou jornais, ou livros de piadas indecentes. Sim! A Bíblia tornará
quem a lê louco para os sistemas do mundo, porém, sábios para Deus.
Ah! Antes que termine, leia a
Bíblia, mas só marque um versículo em destaque quando considerar todo o
contexto do parágrafo, para que não ocorre de cair na tentação da teologia das
porções e o Evangelho esteja algemado pelos versículos que você gosta.
N’Ele, que é a Palavra.