quarta-feira, 9 de maio de 2012

As Desventuras de Um Anti-Herói Evangélico




Mas Deus escolheu as coisas loucas deste
 mundo para confundir as sábias;
e Deus escolheu as coisas fracas deste 
mundo para confundir as fortes"  
(I Coríntios 1 : 27)

De início eu o detestava.
Sua fala era apressada e aguda, mas havia sempre uma acidez provocativa acompanhada de rara persuasão. Sua figura esguia, nervosa e desconcertante, porém altiva e nobre ajudava na imposição de seus argumentos, sempre fervorosos e com o tempo, polêmicos, denunciatórios ... frustrantes!
Tendo como companheiro um inseparável e enorme guarda – chuva era dado a discussões acaloradas e intermináveis. Conversava e opinava sobre os assuntos mais variados, pois era um atento leitor, ótimo observador dos contextos noticiosos, além de possuir apurada perspicácia natural oriunda de suas experiências de vida.
Decantava seus trinta e tantos anos de conversão e não se intimidava com nenhum opositor quando o tema era relacionado à religiosidade. Discutia com padre, pastor, delegado, prefeito, vereador, deputado, pai de santo. Fosse quem fosse não o fazia baixar guarda e contra-argumentava incansavelmente. O que lhe rendeu amargos frutos no decorrer do tempo.
Eu não o suportava.
Talvez o fato de ter congregado nas mais diferentes denominações de nossa cidade tenha contribuído para as nossas desavenças, pois uma das minhas críticas era lhe a falta de raízes denominacional.
Não compreendi sua busca e suas angustias, até o Senhor me fazer descer das certezas matemáticas da teologia de uma era para o chão da percepção humana do outro, às vezes estendido na estrada precisando de socorro.
Só percebi sua dor quando inesperadamente foi encontrado agonizando num banco de praça após ter ingerido veneno para rato.
Ele era um solitário.
Não encontrou o conforto fraterno por onde passou, mas a distância e a incompreensão.
Não achou o calor da irmandade, mas a frieza dos religiosos.
Não teve o acolhimento discipular, mas a rejeição e o desamparo.
Não teve em mim o irmão necessário, mas o despreparado crítico.
Apesar do estado grave, Pamcelo não morreu Deus lhe concedeu mais alguns anos de vida. Porém seu corpo sentiu muito o baque e ficou bastante debilitado. Mas, contrariando os que achavam que ele se internaria em casa, não se rendeu. Depois que se perdôo do crime contra a própria vida, reuniu forças e continuou sua batalha contra uma sociedade pervertida e agora, também, contra uma religiosidade tacanha e hipócrita.
Procurei ajudá-lo, tornamo-nos amigos, apesar do trabalho que me dava tentar convencê-lo a não discutir contra tudo e todos, mas ele insistia em sua luta contra os moinhos de vento.
Era ridicularizado nas ruas, o que me doía, mas quem podia demovê-lo de tais idéias?
Era como um Dom Quixote, de Cervantes e suas imaginárias batalhas ou mesmo o Capitão Vitorino Carneiro, o “Papa Rabo” da obra de Jose Lins do Rego, Fogo Morto.
Mas não era!
Não era um personagem fictício em guerra contra os moinhos de vento ou contra cangaceiros e coronéis. Era um anti-herói zombado pelas praças, porém falando a verdade: “Só Jesus Salva”.
Pamcelo se foi, Deus o chamou para o seu regalo, onde os simples e desprezados tem suas feridas curadas e suas lágrimas cessadas pelo abraço do Pai.
(Evidentemente seu nome não é esse, troquei as letras de lugar para respeitar sua memória e por não ter falado com seus parentes sobre o texto).

N’Ele, que jamais desampara, acolhe e cuida dos humildes.    

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