quinta-feira, 22 de março de 2012

Teologizando Entre Fraldas, Mingaus e Fisioterapia


 

“Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles 
que amam  a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”
(Romanos 8.28)

            Tento fazer teologia na dificuldade de minha rotina.
            Não é muito fácil, tendo em vista que o teologizar cristão é a profunda unidade entre o crer e o pensar, sem distinções dimensionais como o platonismo e o neo-platonismo tanto alardeavam em suas exposições. Além do mais, este “crer e pensar” ou “pensar e crer” precisa ser despejado como prática de vida e na vida, e não apenas ser uma disposição filosófica inerte, com seus eternos pressupostos e suas indagações constantes.
            Há de sempre requerer tempo, disposição, dedicação e disciplina no eterno aprender da Palavra de Deus para um viver abundante.
            Às vezes o Caminho do Senhor em nosso caminhar de existência nos revela necessidades de reconstruções, revalorizações, redescobertas e descobertas de não haviam encontrado a guarita em nosso ser cristão.
            Então, em meio as minhas mais atordoantes crises de fé, em meus questionamentos espirituais. Enquanto buscava respostas para minhas buscas infantis veio o atropelamento.
            Schhhhhhhhhhhh..trás!
            Tudo tão rápido!
            Um instante!
            Alguns segundos.
            E lá estava minha esposa aos gritos. Tive apenas escoriações, mas ela...
            Hospital. Diagnóstico negativo. Cirurgia. Longa recuperação.
            Em casa, tive que me afastar do trabalho para cuidar dela, dos meus dois filhos – um com quase dois anos – e do lar.
            Precisava manter minha disciplina de leitura, meditação e exercitar o escrever, o pensar para não perder a prática. O problema foi que agora, já não havia tempo para meus questionamentos, o menino chorava: hora do mingau! A filha precisava de atenção e cuidado, além de não puder desgrudar nem um pouco de minha esposa, devido o trauma pós-acidente e pós-operatório lhe causava insônia e desânimo, e também havia o problema da difícil recuperação da capacidade de andar.
            E assim, fui transformando toda e qualquer horinha em momento para exercitar a leitura e a meditação. Oração era todo tempo, mas, muitas vezes trancado no banheiro,  derramar-me ante o Senhor, tendo o cuidado para não deixar que vissem minhas lágrimas e isso de alguma forma ser negativo em tão delicado momento.
E então, entre fraldas, mingaus, conselhos – para a filha mais velha - e longas seções de fisioterapia pude perceber o quanto de tempo perdi no redemoinho das mais tolas questões.
            Perdi tempo questionando Deus, quando deveria amá-lo de todo o meu coração, força e mente.
            Perdi tempo questionando o evangelho, quando deveria estar fazendo discípulos.
            Perdi tempo discutindo o sexo dos anjos, quando deveria estar proclamando a Boa Nova.
            Perdi tempo me rotulando e alindo-me em guerras do passado, quando deveria amar o próximo e suportar os débeis na fé.
            Perdi tempo construindo um “evangelho” que eu entendesse, enquanto deveria absorver a Graça e o Amor infinito de Deus.
            O Salmista afirmou que lhe foi bom passar por aflição, porque lhe trouxe ensinamentos (Salmos 119.71).
Agora vejo como Jó, e me humilho no pó que sou, sabendo que o Senhor em seu Ser não pode ser adequado em nossos pensamentozinhos, Paulo já nos diz em Romanos 11.33-36, e em outro lugar a Palavra afirma: “Eu é que sei que pensamentos tenho a teu respeito” (Jeremias 29.11).
            Aprendi com a escola de Deus: a vida e as tribulações, que forjaram minha confiança n’Ele. Aprendi que a graça e a misericórdia do Senhor, não são apenas belas palavras bíblicas, mas uma realidade que ajudam no amadurecer da fé, amor e esperança.
            Em tempo:
            Faço um excelente mingau, quebrei qualquer barreira de relacionamento com a minha filha, nos aproximamos e nos auxiliamos, cerquei de carinho e cuidados a minha amada, descobrindo um no outro uma força inimaginável.
            Deus atuou em seu corpo, sua recuperação foi considerada um milagre pelos médicos que a assistiram. E Deus sarou seu coração, chorei quando em oração, junto com Cláudio, meu pastor, ela perdoou o motorista.
            Faço teologia profundamente arraigada na fé inegociável no Deus que nos conduz em triunfo.
            Lembrei até da grande escritora Clarice Lispecto, que em certo texto, afirmava que construía sua literatura em meio as rotinas diárias de uma dona de casa.

            Em Cristo, que nos faz compreender depois.

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